Os Livros Pseudepígrafos


 Além do conjunto de livros e/ou textos que compõe a Bíblia Cristã/Hebraica, há uma quantidade expressiva de literatura que foram produzidas paralelamente e que por diversas razões ficaram fora da seleção canônica que deu origem às duas partes da nossa bíblia, que são denominados de Antigo Testamento, que compõe a bíblia hebraica, e o Novo Testamento, que somados compõe a bíblia cristã. Esta literatura que permaneceu alienada podem ser classificadas em dois grupos principais: os apócrifos e os pseudepígrafos.

            Os apócrifos (escondidos, secretos) perfazem um grupo de quinze livros relacionados ao Antigo Testamento, que alguns ramos do cristianismo – a Igreja Ortodoxa Russa, Ortodoxa Grega, a Católica Romana[1] e a Copta – os incluem em suas bíblias, ainda que diferentemente, por entenderem serem estas literaturas revestidas de autoridade espiritual (inspiradas). Mas os reformadores do século XVI sempre rejeitaram esses livros como parte integrante do cânon. Apesar deles conterem alguns ensinos e conceitos teológicos até grotescos, esta coleção de escritos contém informações relevantes para que possamos compreender o contexto em que os fatos narrados no Novo Testamento ocorreram. A literatura apócrifa ficou conhecida e popularizada porque foram acopladas na Septuaginta, versão grega da bíblia hebraica. Eles foram produzidos entre o segundo século a.C. e o primeiro século d.C.

            Os pseudepígrafos (escritos falsos e/ou espúrios) foram produzidos entre o segundo século a.C. até o quinto e possivelmente o sexto século d.C. Mormente esses escritos são atribuídos à nomes proeminentes do Antigo Testamento. Em sua grande maioria são escritos de origem judaica, mas é possível perceber vestígios de interpolações cristãs e até mesmo entre eles haja alguma obra eminentemente cristã. Nestes mais de cinquenta textos encontra-se uma diversidade de temática: apocalíptica, poesia e sabedoria, históricos, o Midrash e outras formas literárias. Da mesma forma estas literaturas contribuem na elaboração do contexto histórico/religioso que nos permitam uma melhor compreensão do que estava acontecendo no período neotestamentário e primórdios do cristianismo.

            É preciso esclarecer que alguns livros Apócrifos também são escritos com "falsas assinaturas" ou seja, se apropriam de nomes conhecidos - Baruque, Carta de Jeremias, 2 Esdras, Sabedoria de Salomão, etc., e desta forma acaba criando alguma confusão em torno de livros que são considerados Apócrifos daqueles livros que são parte dos Pseudepígrafos. Todavia, em sua obra de grande envergadura acadêmica, James Charlesworth (2010, p. xxv) propõe cinco características básicas para identificar os livros Pseudepígrafos:

a)    São escritos judeus/cristãos

b)    São frequentemente atribuídos (autoria) a figuras ideais do passado de Israel

c)    Habitualmente reivindicam conter palavra ou mensagem de Deus

d)    Frequentemente constroem suas ideais e narrativas a partir de textos do Antigo Testamento

e)    E quase sempre foram compostos durante o período de 200 a.C. a 200 d.C., ou até mais tarde, e aparentemente, preservar, ainda que de uma forma editada, tradições judaicas que datam desse período.

 

Autoria

            Na Antiguidade a questão de autoria não tinha a mesma relevância que temos atualmente. Por esta razão as obras circulavam livremente, sem qualquer restrição, podendo ser apropriados livremente, por esta razão a obra denominada de 2 Baruque, afirma ter sido escrita pelo discípulo do profeta Jeremias chamado Baruque, personagem histórica do século 6 a.C., entretanto, as evidências internas do livro indicam que foi escrito no segundo século d.C. e certamente não foi por aquele personagem bíblico do livro de Jeremias. Mas ao se atribuir à Baruque o que se propõe é revesti-lo do valor e autoridade intrínseco da antiguidade.

            Deste modo, não é possível determinarmos alguma autoria para os livros Pseudepígrafos, mas é possível determinarmos com alguma precisão, muitas vezes, onde e qual o contexto histórico em que eles foram escritos. Quando se estabelece isso obtemos uma visão mais ampla da situação histórica e o desenvolvimento tanto dos primórdios do judaísmo quanto, posteriormente, do cristianismo.

 

Relevância Histórica

            Esta imensa gama de literatura Pseudopígrafas foi quase totalmente ignorada por muitos séculos, sendo resgatadas em seu estudo crítico e acadêmico apenas no século dezenove pela chamada Escola Tubingen que naquele momento buscavam descobrir as pontes da transição do judaísmo para o cristianismo.

A literatura Pseudepígrafa nos proporciona pequenas janelas por onde podemos contemplar alguns instantâneos do desenvolvimento histórico do judaísmo e também do cristianismo iniciante:

Nos fornecem subsídios para melhor compreendermos as diversas situações histórica-cultural-religiosas e as implicações que geraram tantos conflitos.

Eles esclarecem muito sobre o caráter do judaísmo posterior, complementando os escritos canônicos do Antigo Testamento e revelando as influências étnicas sofridas pelos judeus no período em que esses livros estavam sendo escritos.

Fazem a ponte entre o Velho e o Novo Testamento, prenunciando as novas ideias que aparecem no último.

As ideias e imagens dos escritos Pseudoepígrafos influenciaram não só os cristãos das primeiras gerações, mas continuaram a refletir-se nas produções e pensamento do mundo da Idade Média.

O conhecimento mais profundo adquirido atualmente da cultura do Antigo Oriente tem comprovado que até mesmo a cultura do presente esta influenciada e condicionada pelo que aparece nesses escritos.

            A título de demonstrar a relevância desta literatura transcrevo uma lista, não exaustiva, das literaturas pseudoepígrafos mais relevantes e conhecidas, ou seja, mais exaustivamente estudas:

Livros de Adão e Eva - tradução da versão latina

A vida de Adão e Eva - tradução da versão eslava

A vida de Adão e Eva - tradução da versão grega (O Apocalipse de Moisés)

Apocalipse de Adão

O Livro de Adão

O Segundo Tratado do Grande Sete

1 Enoque (Etíope Apocalipse de Enoque)

1 Enoque (cf. Charles, Lawrence e outros)

2 Enoque (eslava Livro dos Segredos de Enoque)

Melquisedeque

Livro de Abraão

Testamento de Abraão

Apocalipse de Abraão

Apocalipse de Moisés

A história de Azenate

Seleções do Livro de Moisés

Revelação de Moisés

A Assunção de Moisés (O Testamento de Moisés)

O martírio de Isaías

A Ascensão de Isaías

Apocalipse de Esdras

Livro dos Jubileus

Testamento dos Doze Patriarcas

Testamento de Moisés

Testamento de Ezequiel

Testamento de Jó

A Carta de Aristeu

Apocalipse de Sofonias

Apocalipse de Jeremias

Apocalipse de Zacarias

Apocalipse de Baruque (2 Baruque)

O Apocalipse grego de Baruque (3 Baruque)

Fragmentos de uma obra Zadoque (cf. O Documento de Damasco)

O Testamento de Salomão    

 

 

Utilização livre desde que citando a fonte

Guedes, Ivan Pereira

Mestre em Ciências da Religião.

Universidade Presbiteriana Mackenzie

me.ivanguedes@gmail.com

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Referências Bibliográficas

CHAMPLIN, R. N. Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia. V. 5. São Paulo: Hagnos, 2006.

Charlesworth, J. H. The Old Testament Pseudepigrapha. (Hendrickson Publishers, 2010).

Pseudepigrapha, Apocrypha and Sacred Writings - http://www.pseudepigrapha.com/

The New Schaff-Herzog Encyclopedia of Religious Knowledge [Dictionary edition] http://www.ccel.org/ccel/schaff/encyc09.html?term=Pseudepigrapha,%20Old%20Testament

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