O HOMEM QUE NÃO SABIA SER PAI

 

Era uma vez um homem que não sabia ser pai. Ele tinha dois filhos. Uma menina e um menino. Isso complicava as coisas ainda mais. Não bastasse um filho, tinha dois. Não bastassem dois, um de cada jeito. Não bastassem dois tão diferentes, um era menina e outro era menino.
Cada vez que olhava para seus filhos ele ficava apavorado. Principalmente quando a mãe estava por perto. Sempre desconfiou que as mães vêm com um chip de fábrica, uma espécie de software auto-executável que começa a rodar quando o nenê nasce. Mãe sabe falar daquele jeitinho, sabe pegar no colo, sabe a temperatura certa da mamadeira, conhece todos os remédios, e sabe dizer pros médicos o dia certinho que começou a tosse. Ele não sabia quase nada. Sabia ajudar, e de vez em quando a mãe dizia: "Pode deixar que eu faço, vai pra sala, vai..." Quando isso acontecia ele ficava arrasado, sentia que não prestava pra nada.
O homem que não sabia ser pai queria muito aprender a ser pai. Começou a conversar com os amigos e percebeu que eles também não sabiam. É verdade que encontrou alguns que mais se pareciam mães disfarçadas de pais, mas eram poucos. A maioria dos amigos era muito parecida com ele, lutava para ser pai. A pior coisa que acontecia era quando um amigo dele achava que ele sabia ser pai e vinha fazer um monte de perguntas. Foi por causa disso que ele aprendeu a fingir que sabia ser pai. Quando a família estava reunida ele falava grosso, tipo: "A senhora já cuidou dos seus filhos, agora eu vou cuidar dos meus". Quando as crianças ficavam impossíveis ele fazia cara de bravo, dava uns gritos e colocava a casa em ordem. Se alguém estivesse assistindo, até imaginava que ele tinha as coisas sob controle.
A medida que o tempo foi passando, ele foi ficando mais desesperado. O homem que queria aprender a ser pai passou a observar os filhos dos outros pais. Quando encontrava um bom menino ou uma menina que todo mundo elogiava, ficava de olho nos pais deles para ver se conseguia aprender alguma coisa. Mas quando encontrava uma menina em conflito ou um menino dando trabalho, não falava pra ninguém, mas pensava "também, com aquele pai, só podia dar nisso". De vez em quando conversava com um pai que tinha um "filho problema", ficava mais consolado. Mas logo lembrava que ele ainda não sabia ser pai.
O homem que não sabia ser pai acreditava que existia uma fórmula, algo como uma lista de coisas que deveriam ser feitas e que, se fossem bem feitas, garantiriam que os filhos se tornariam as pessoas que ele gostaria que se tornassem. Durante muito tempo ele fez de tudo para descobrir a tal lista: leu livros, fez cursos, ouviu histórias, conversou com pessoas e foi até procurar os especialistas.
O esforço do homem que não sabia ser pai foi tamanho que ele colecionou um montão de coisas a respeito de pais, mães e filhos dos outros. Um dia ele ficou tão cansado que resolveu dar um fim naquilo. Mas por alguma razão resolveu reler tudo antes de jogar fora. Passou horas apreciando aquelas coisas a respeito de pais e filhos: um montão de fotografias de aniversários, formaturas, viagens de férias e bilhetinhos e cartões com a letra “E” ao contrário e a letra “R” também . Aos poucos foi percebendo que a pilha de histórias boas era incomparavelmente maior do que a pilha com histórias que não tinham um final muito feliz.
Foi concluindo que todas aquelas eram histórias de pais que não sabiam ser pais e de filhos e filhas que não sabiam ser filhos e filhas. De repente, levou um susto, como se uma luz se acendesse e ele finalmente compreendesse tudo: durante toda a vida ele acreditou que não sabia ser pai porque estava brincando de "papai sabe tudo", mas descobriu que o nome certo da brincadeira era "papai ama muito". Naquele dia ele acreditou que era o melhor pai do mundo.

Por: Ed Renê Kivitz

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